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Pintassilgo |
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Juriti |
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Azulão |
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Araponga |
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Rouxinol |
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Siriema |
Quem, dentre todos, desprendendo sua voz de ouro seria proclamado rei-cantor saudando a alvorada e o crepúsculo? Até um papagaio velho que sabia de cor e salteado o "Parabéns a você, nesta data querida, muitas felicidades, muitos anos de vida", havia ensaiado dezenas e dezenas de vezes esse verso a ver se levantaria o prêmio...
Interessante que a festa seria ao anoitecer. Foram escalados miríades de pirilampos para iluminar o palco com suas lanterninhas faiscantes.
E como ficou poético o recinto, claro como o dia, tendo por teto o céu escuro cravejado de cintilantes estrelinhas e adornado com a lua prateada lá no espaço! Começou a festa, o desafio. À mesa julgadora se sentaram os juízes: um idoso elefante, um orgulhoso pavão, uma macaca muito distinta, um senhor pica-pau bastante inteligente e uma saracura muito profunda em matéria de música. Os animais ferozes como tigres, leões, leopardos e onças não foram convidados para não assustar as avezinhas cantoras; nem tampouco o bicho-preguiça porque levaria mais de um mês para ali chegar... O orador que apresentava cada número era um papagaio novo que mais parecia um advogado, tão calorosa e entusiasta era sua palavra!
Muito elegante começou: - Meus amigos, prezados artistas, boa noite! Aqui estamos, nesta festiva data da abertura da primavera para escolher o rei-cantor das selvas! Todos os nossos artistas estão bem preparados! Ouçamos como primeiro número, um fado muito sentimental, canta pelo mestre Sabiá, que o dedica à memória de sua mãe. O cantor pousou graciosamente no galho florido de uma quaresmeira e desprendeu da garganta lindo e sonoroso canto! Relatava, nesse fado, a triste história de sua mãe que morrera de saudades da mata, presa numa gaiola.
Quando terminou, a passarada bateu palmas, isto é, bateu com calor suas asinhas, aprovando-o. -Agora, senhores, atenção! pediu o locutor. Ouviremos uma alegre canção pelo pássaro tagarela e sapequinha de nossa floresta... mestre Bem-te-vi. Espevitado e feliz ele cantou em versos tudo que via pelo mundo: o moleque com estilingue em riste, o gato da comadre que o olhava com ternura, querendo papá-lo, o garoto malvado que lhe armara uma vez o alçapão, tudo dedicado a sua graciosa noiva. As palmas estrugiram!
Vieram então os irmãos cantores, os célebres canários. Que maravilhosa harmonia saía de suas gargantas privilegiadas! Enquanto o segundo fazia o contralto, o primeiro entoava a melodia de soprano, um verdadeiro dueto de flauta mágica...
Retumbaram os aplausos! Esse dueto foi dedicado aos dignos membros da mesa julgadora.
-Silêncio, silêncio amigos! Teremos como últimos números da primeira parte deste concurso, o solo: "Parabéns a você" pelo mestre Papagaio e a canção dos Rouxinóis. Quando o velho papagaio cantou "Parabéns a você", a turma explodiu em risadas a custo abafadas: - Coitadinho, sua voz semelhava a uma taquara rachada! A canção dos Rouxinóis, delicada e suave, fôra dedicada às jovens esposas. Que melodia sem par! Intervalo! Intervalo! E dois elefantes apareceram com tabuletas onde se lia intervalo!
-Eu acho que os canários vão ganhar, cochichava D. Saracura ao ouvido de uma prima; por mim acho que o sabiá tem mais alma, comentava o elefante, bem, vejamos até o final, para depois julgarmos... Nesse momento aparecem duzentos beija-flores apresentando nos longos bicos pedaços dourados de favos de mel, ofertados como presente de festa, pelas abelhas.
E o saboroso doce natural foi distribuído a todos os assistentes. Duzentas macaquinhas donairosas, com flores vermelhas na cabeça e aventaizinhos verdes de folhas de bananeira serviam jabuticabas, maracujás, coquinhos maduros, a fartar. Tudo era riso, conversa, alegria! De repente, surgiram os elefantes com suas tabuletas: Silêncio, silêncio! Toda a bicharada fechou a boca e ficou atenta.
-Amigos, tornou o orador, prossigamos com nosso concurso sem mais tardar. Continuemos, pois! - O Canto das Siriemas, dedicado à memória de uma irmão. Elas apareceram. Muito Simpáticas e despretenciosas cantaram, em versos, a infeliz odisséia do irmãozinho apedrejado pelo estilingue de um moleque muito mau!
Foram muito aplaudidas. Como penúltimo número, senhores, Trio Primaveril, dedicando à mais bela das estações do ano. Que trio encantador o das juritis.
-Bem, amigos, chegamos ao término do programa; ouviremos com prazer um coro ensaiado pelo consumado artista mestre Sabiá - Chama-se "Coro das Selvas". Atenção senhores, este número foi reservado como chave de ouro para encerrar o debate musical.
Ele é dignamente dedicado ao maior Artista do Universo, ao Músico dos músicos, Cantor dos cantores... Adivinhem quem é o Homenageado!... Um murmúrio de curiosidade perpassou pelo auditório: - quem será esse Artista, quem será esse soberano Cantor e Músico? - Senhores, continuou o locutor, vejo que o interesse de todos é imensurável! Pois saibam que esse soberano Artista, Cantor dos cantores e Músico dos músicos não é outro senão o nosso Deus, o nosso Criador!
A Ele que criou a alvorada e o crepúsculo, que nos pôs na garganta sons maviosos, trinados, gorjeios, enfim a música divina, a Ele glória e gratidão dos pássaros cantores! Portanto, o "Coro das Selvas" vai homenageá-Lo, vai cantar um hino ao seu Criador denominado: "Sinfonia da Floresta". Um entusiástico bater de asas abafou as últimas palavras do orador. Vinha surgindo mansamente a madrugada... Os primeiros clarões e rubores da aurora invadiam os céus...
Então se apresentaram na clareira, canários, gaturamos, pintassilgos, coleirinhas, azulões, bem-te-vis, sabiás, rouxinóis, pássaros-pretos, arapongas, cardiais, juritis, tico-ticos e uma infinidade de outros passarinhos mais...
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Coleirinha |
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Gaturamo |
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Cardeal |
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Tico-tico |
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Pássaro-preto |
Com gracioso baixar de cabecinhas coloridas dos mais variados matizes cumprimentaram a seleta assistência. Depois surgiu o regente, o velho Sabiá-cantor trazendo, sob a asinha, sua pequenina batuta, uma flexível varinha de bambu. Ergueu-a, imponente, e a Sinfonia começou. Que beleza, Santo Deus! Que espetáculo grandioso, que deslumbramento! Todos os pássaros, sem exceção, louvaram o Criador, saudando os primeiros raios do Sol! Enquanto os sabiás entoavam a melodia, os canários davam trinados, os rouxinóis desprendiam gorjeios; as arapongas e saracuras faziam o baixo, entravam depois os bem-te-vis e gaturamos, respondiam em pipilos, os azulões e juritis numa orquestra tão bela, tão sublime, impossível de se descrever! Os aplausos, no final, eram ensurdecedores: os gritos de Vencedor, Vencedor, ecoaram pela mata a dentro... Depois mestre Pavão, escondendo os pés por sabê-lo muito feios, e abrindo a formosa plumagem por sabê-la inigualável, falou:- Atenção, senhores, Atenção!
Educados, os bichinhos era todo-ouvidos. - Senhores, a mesa julgadora, por unanimidade de votos, decidiu o seguinte: - Fica decretado nesta noite que, enquanto houver madrugada e pôr do Sol o "Coro das Selvas" louve a Deus, anunciando à humanidade toda, o nascer e o morrer do dia. - Apoiado! Apoiado! E o velho regente, mestre Sabiá, terminou: - E é por isso que as aves, sem exceção, cada manhã e cada escurecer, entoam a "Sinfonia da Floresta", em honra ao Seu Criador!
Uma bela lição para todos nós seres humanos. Seria uma demasiada cortesia cada manhã, ao abrir os olhos a criatura humana saudar, agradecida, seu Criador e descerrando as janelas sussurrar amavelmente: "bom dia, meu Deus, meu Pai Celestial. Muito obrigada pela noite serena de sono que me concedestes, pelo ar que respiro, pelo azul incomparável que contemplo! Da mesma forma ao entardecer serem gratos, enviando palavras de agradecimento a Deus pelo dia que termina.